quinta-feira, 16 de setembro de 2010

a história de uma lágrima. Capítulos 1,2 e 3

IDILIO OLIVEIRA DE ARAÚJO

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A história de uma lágrima.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

                           

 

 

 

 

 

 

                              Zara Feus

 

                            Idílio Oliveira de Araújo

                                     

 

 Capítulo 1.

 

Nasci escondida em milhões de esperanças.

Apesar de única, por ter minha individualidade e meu livre arbítrio, estive igual a outras tantas lágrimas, por longos períodos.

Evidentemente nasci para um propósito, não um único, mas um por excelência, morrer para aliviar o sofrimento e a dor de um outro ser, aquele que me conteve em suas entranhas.

Quando lá estive, no nascedouro de mim, distribuída entre minhas irmãs, parecíamos um grande rio, mas cada uma de nós éramos única, e sabíamos o nosso encontro derradeiro, do nosso propósito, do nosso fim.

Eis que desde a concepção vivíamos e nos ensinaram esse objetivo em nossas vidas, o de servir para desentoxicar o coração do nosso portador maior, outros mais românticos, que viviam entre nós, nos viam como os únicos seres no universo capazes de lavar a alma insana do filho do filho, outros, pragmáticos nos ensinaram a amar nossa causa, pois vez por outra, uma lágrima perdida poderia ter outra finalidade, outro objetivo, menos dignos, como o de morrer por nada.

Crescemos na ilusão de uma vida futura, após a caída final renasceríamos na terra, nos frutos, nas sementes, mas eis que deixaríamos a nossa essência, não mais seríamos lágrima, não mais seríamos únicas.

Eis a minha dor, nessa minha história. Não suportava deixar de ser eu mesma, deixar de ter meu livre arbítrio, deixar de ser uma essência única.

Que vivesse em preparação para a derrocada final, quanto mais imaginava a chegada ao olho, mais sofria com o depois, a total falta de certezas, ai como me doía não poder participar de uma vida com as minhas queridas irmãs, outras lágrimas, outras e outras.

 

Capítulo 2.

 

Resolvi protestar, gritar por esclarecimentos reais.

Convoquei uma assembléia. A primeira assembléia das lágrimas.

Iria exigir o conhecimento do depois. Afinal éramos preparadas durante toda a vida para o momento da descida na íris e o escorrer pela face sofrida, mas ninguém esclarecia o depois, nem mesmo as lágrimas contidas, mais experientes, que haviam visto o mundo exterior e voltado pelo canal da partida, nem elas sabiam do depois.

Nos reunimos próximo ao coração, pois lá era o melhor local para uma reunião sobre o depois, afinal o coração é o órgão da razão, não das emoções como pensavam as lágrimas que deixaram sua sabedoria para nós. O coração é o único ser que guarda na memória a gratidão pelo nosso esforço em aliviar a sua dor, a dor do coração, éramos nós, as lágrimas o bálsamo para o coração partido, a plenitude para o coração feliz.

Gritei, como um corpo látego, como um menino perdido...

- Irmãs de destino, fiéis escudeiras do coração, amigas da alma, precisamos conhecer, o conhecimento nos libertará da escuridão de nós, não é só o saber que nos libra ás alturas, é necessário compreender o que se sabe, é necessário entender o porque se sabe.

Durante milhões e milhões de anos vivemos, pois somos continuidade dos nossos ancestrais, na ignorância do nosso amanhã, lendas, mitos de uma vida depois, mas nada sabemos, nada conhecemos.

Não basta viver, é necessário compreender a vida, compreender o nosso propósito.

 

Capítulo 3.

 

A reunião começou pontualmente na hora prevista, me encontrava ansiosa, afinal tínhamos sido cientificadas que o cérebro, o conhecedor dos destinos, compareceria à reunião pessoalmente, apesar de ele, encontrar-se em toda a parte do corpo, quando deslizava por entre veias e sonhos, naquele dia, ele compareceria seria uma decisão inédita na vida das lágrimas, conheceríamos e aprenderíamos da fonte do saber.

Ele chegou como um sábio, nada falou, apenas observou com olhos atentos e nos permitiu o silêncio, apenas o silêncio.

O silêncio se fez por alguns minutos nos sentimos inquietas mas a situação nos impelia a paciência, a espera racional da busca do saber.

De ímpeto o cérebro falou aos nossos olhos como que inebriados pelo semblante calmo e complacente daquele ser.

- Queridos segredos que enlaçam nossa desdita e agonia, a descida suprema da alma esquecida ao poço das recordações, a esperança da continuação e a certeza de um amanhã de luz.

Oh! Quão bom e suave é que as irmãs vivam em união, é a revolução do amor, é a fulminação do esquecimento.

Somos parte de um propósito maior, e somos cada uma de nós, pois também sou lágrima que decide a partida, um propósito do criador, somos o grande rio e somos cada gota que verte o rio e caminha em direção ao grande mar, e quando chegarmos no grande oceano seremos o todo e cada uma partícula do todo, em uma sintonia de amor e luz.

Vivemos para aliviar a dor e somos a esperança da continuação do mundo, mas somos únicas e apesar de viver com o fim que nos alimenta, esse fim é apenas uma etapa da nossa evolução, do crescimento de nós.

Irmãs da esperança, vós sois o sal da terra e a terra depende de nossa árdua e prazerosa tarefa de permitir que a espécie humana viva e sobreviva por nós e de nós.

Para onde vamos depois da viagem derradeira não é nossa espera maior ou questão mais urgente, e sim quem somos e qual a nossa objetividade no agora.

Vivamos a plantear o nosso amanhã mas não nos preocupemos em demasia com o que há por vir depois do depois, sejamos breves no desejar  e sejamos ágeis no restaurar a dor e vivamos dia  a dia a tocar esperança na alma do homem.

Que nossa luta não seja em vão, que nosso propósito tenha objetividade em nós, mas sejamos pacientes na viagem até a íris e no depois, sejamos espera, para compreendermos que somos passageiras na grande vida, mas temos a nossa própria vida, se breve ou se efêmera, é apenas uma fase na certeza de nós.

 

 

 

 

 

 

Um comentário:

  1. (...)"somos cada gota que verte o rio e caminha em direção ao grande mar, e quando chegarmos no grande oceano seremos o todo e cada uma partícula do todo, em uma sintonia de amor e luz", nossa....poeta é uma das coisas mais lindas e mais verdadeiras que já li, e quando esse momento chegar que todos os seres encontrem a Paz e a Felicidade almejada.....grande abraço.

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